A Aula Aberta com Maria Helena Andrés, realizada no primeiro sábado de outubro, dia 3, na Chácara Santa Eulália, no bairro São Bernardo, Região Norte de Belo Horizonte, marcou oficialmente o início das atividades da Escola Guignard no local que futuramente sediará o Memorial Alberto e Priscila Freire e se tornará também um espaço de pesquisa e experimentação artística da Escola Guignard UEMG.

Cerca de 35 pessoas, de diversas gerações de artistas da Escola Guignard, estudantes e convidados apreciaram o evento ao ar livre em local de natureza exuberante e uma agradável conversa sobre o fazer artístico. Entre os presentes, prestigiaram o encontro o secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais, Angelo Oswaldo, a diretora e o vice-diretor da Escola Guignard Ana Cristina Brandão e Carlos Wolney.

Maria Helena (na foto, à direita da professora Marina Nazareth), que integrou a primeira turma formada pelo próprio Alberto da Veiga Guignard na década de 1940, relembrou a metodologia de aulas e as abordagens do “mestre”, como ela mesma a ele se refere. “Antes de iniciar qualquer procedimento artístico, Guignard nos ensinava a observar, treinar o olhar sobre as cores, as formas”, afirma. “Ele se interessava mais em que desenvolvêssemos nossas próprias soluções artísticas de representação das coisas do que simplesmente replicássemos as técnicas que já existiam”.

 

Nesse sentido, afirmou que esse procedimento do artista se aproximava bastante de filosofias orientais presentes principalmente na cultura da Índia, país que Maria Helena visitou diversas vezes e de cuja cultura lhe rendeu um ensaio inédito, encontrado recentemente entre suas anotações e lido integralmente para os participantes, embasado principalmente no estado de contemplação que Guignard incitava em seus estudantes.

“Essa metodologia um pouco mais solta, de deixar o estudante buscar suas respostas me interessa mais”, opina a estudante do 2º período de Artes Plásticas, Amanda Muinos Andrade, de 22 anos. “Acho importante a técnica ser repassada, mas quero primeiro ter a oportunidade de, por exemplo, tentar criar uma sombra ou volume sozinha. Quando alguém já te concede a técnica, ela tira sua possibilidade de criar uma solução diferente”.

Na segunda parte da programação do dia, os participantes puderam visitar a Coleção de Arte Popular do Vale do Jequitinhonha e presenciar ainda uma aula de desenho a céu aberto, que emulou as primeiras lições de Guignard ainda no Parque Municipal, primeiro local de funcionamento da Escola. Os professores convidados para lecionar foram Abílio Abdo e Marina Nazareth.

Organizador do evento, o professor Adriano Gomide (foto) afirma que a intenção de oferecer uma Aula Aberta foi prestar homenagens — à Escola Guignard, que completou 70 anos em 2014, a seu fundador e à Maria Helena Andrés — e instituir um marco do início das atividades realizadas no local que futuramente abrigará o Núcleo de Experimentação e Pesquisa.

“Temos um legado de formação de talentos iniciado por Guignard e o evento de sábado, com a reunião de diversas gerações de artistas, nos auxilia a consolidar a ideia de que nossa primeira visão para qualquer ação no local será pela lente da arte”, comenta.

Gomide afirma que se encontra em fase de planejamento o projeto de institucionalização do local com a coordenação da professora Marina Nazareth, apoiado sobre quatro ações. Além do Memorial que será aberto no futuro a visitação pública e do Núcleo de Experimentação Artística para estudantes da Escola Guignard e para a comunidade em geral, pensa-se também no convite a ilustradores botânicos para que elaborem um inventário da flora e fauna locais, inspirado nos diversos trabalhos realizados por Missões Artísticas Europeias no Brasil no século XIX, como a Missão Austro-alemã e a Missão Francesa, que tinha nomes como Jean-Baptiste Debret.

A última ação seria elaborar um plano de envolvimento com a comunidade local, de forma a apresentar a arte como instrumento transformador da realidade. A Chácara está localizada em um bairro de vizinhança humilde, na Região Norte da capital mineira, que constitui a Vila São Tomás. “Quando resolvi morar aqui, diziam que eu estava louca, que seria roubada ou sequestrada. Estou aqui há 40 anos e nunca aconteceu nada”, reconhece a colecionadora Priscila Freire.

O intuito desta ação será principalmente prospectar na região pessoas e/ou instituições que já atuem na comunidade de forma a estabelecer novas parcerias e somar esforços. Gomide citou como exemplo unir-se a iniciativas como foi o Projeto Voo para a Cidadania, que a Infraero realizou durante anos com jovens da região trabalhando o aprimoramento de suas habilidades artísticas e que teve à época a participação do professor da Escola Guignard Thiago Carvalho Pena.

Em 17 de fevereiro de 2014 a colecionadora Priscila Freire (foto à esquerda) assinou na Reitoria da UEMG um termo em que doou aos cuidados da Universidade do Estado de Minas Gerais sua coleção de arte composta por diversas de pinturas de artistas, como Guignard e Pancetti; desenhos de Tarsila do Amaral; gravuras; pinturas e esculturas, além de uma rica coleção de cerâmicas do Vale do Jequitinhonha.

O ato consiste também na futura transição da Chácara Santa Eulália, uma reserva ecológica com mais de 50 mil m², para o Memorial Alberto e Priscila Freire e um espaço de experimentação artística da Escola Guignard UEMG.

Desde então, encontra-se em curso a catalogação do acervo artístico do local pelo professor Adriano Gomide e pela colecionadora Priscila Freire. Outra ação que tem sido realizada são pesquisas e visitas a locais que utilizam o conceito de casa-museu e que possam auxiliar na adoção de um modelo de administração futura da Chácara.

O secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais, Angelo Oswaldo, enalteceu a doação de Priscila Freire, afirmando que Guignard finalmente ganhava para si também um parque.

“A Priscila está construindo um ato histórico, referencial para o país, ao transformar esta chácara em extensão da Escola Guignard e da Universidade do Estado de Minas Gerais, um território da arte”.

Justificou a grandeza do ato ao citar o exemplo de algumas coleções particulares, para as quais seu colecionador explicitamente anuncia um destino público após sua morte, e cujo desfecho original se interrompe por questões complexas, como partilhas e herança.